O que é MEMÓRIA? II

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O arrependimento, além de lembrança das faltas, é também um apelo à memória de Deus, e, no perdão, Deus, cuja lembrança é a do amor, lembra-se da Aliança e esquece o pecado: Jr 31.34 - Porque esta é a aliança que firmarei com a casa de Israel, depois daqueles dias, diz o SENHOR: Na mente, lhes imprimirei as minhas leis, também no coração lhas inscreverei; eu serei o seu Deus, e eles serão o meu povo.

Eis, então, o paradoxo: a celebração da Páscoa do passado, pretérita, é agora uma expectativa que está ainda por vir. O povo se lembra de tudo que Javé fez por ele: o passado prova a fidelidade de Deus. Mas o presente é decepcionante. É, portanto, no futuro, num “tempo vindouro”, que se cumprirão as promessas já parcialmente realizadas. Fidelidade e decepção abrem a consciência do povo de Deus para a perspectiva de “últimos tempos” decisivos. Essa percepção muito viva do futuro mediante o passado caracteriza a memória do povo depois da volta do exílio; há nisso uma espécie de mutação. A recordação se torna expectativa, e a memória desemboca na imaginação apocalíptica. Um caso típico são os capítulos 40 a 48 de Ezequiel, seguido de Zacarias, Daniel, do IV evangelista e o autor do Apocalipse.

Comunitariamente, o passado glorioso constitui, em meio à aflição do presente, o penhor da libertação. Pessoalmente, o pobre, aparentemente esquecido por Deus, precisa saber que está presente na memória e no amor de Deus. A provação reaviva a memória, e isso para prepará-la ao acontecimento Nov: Is 43.18 - Não vos lembreis das coisas passadas, nem considereis as antigas.

Quando “Javé está presente”, a memória coincide com o presente, e tem-se a realização. A recordação das promessas e da Aliança se consuma no evento de Cristo que recapitula o tempo II Co 1.20 - Porque quantas são as promessas de Deus, tantas têm nele o sim; porquanto também por ele é o amém para glória de Deus, por nosso intermédio. Nele se resolve o drama dos dois esquecimentos pela volta do homem e o perdão de Deus. Uma vez que, em Cristo, está presente Deus que se lembra do homem, o homem não mais precisa procurar Deus no passado, e sim hoje, em Cristo. Jesus Cristo é o homem definitivamente presente diante de Deus, e Deus definitivamente presente na história de homem. O Cristo-Sacerdote nos faz aceder ao Pai e seu Espírito nos põe em comunhão com ele: Rm 8.15 - Porque não recebestes o espírito de escravidão, para viverdes, outra vez, atemorizados, mas recebestes o espírito de adoção, baseados no qual clamamos: Aba, Pai. O próprio Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus.

Mas o tempo ainda não se consumou, e se Deus agora está presente numa Aliança nova e eterna, o homem está muitas vezes ausente de seu Deus e tem necessidade de se lembrar. Por isso o Espírito “recorda” o mistério de Cristo, não como um livro, mas na atualidade pessoal da Palavra viva: Jo 14.26 - mas o Consolador, o Espírito Santo, a quem o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar-se de tudo o que vos tenho dito. O Espírito realiza o mistério de Cristo no seu Corpo, não como um simples memorial, mas na atualidade sacramental deste Corpo ao mesmo tempo ressuscitado e presente ao mundo: a liturgia. Essa “re-presentação” da Páscoa, tal qual no Primeiro Testamento, está ordenada à ação, à vida: a memória cristã consiste em “guardar os caminhos de Javé”, em guardar os testamentos do Senhor, isto é, em permanecer no seu amor.

Enfim, o último ajuste da memória do homem à de Deus: quanto mais o Espírito penetra a vida de um cristão, tanto mais o torna vigilante, atento aos “sinais dos tempos”, testemunha que deixa transparecer a presença atuante do Senhor e revela a aproximação da sua vinda: Ap 3.3 - Lembra-te, pois, do que tens recebido e ouvido, guarda-o e arrepende-te. Porquanto, se não vigiares, virei como ladrão, e não conhecerás de modo algum em que hora virei contra ti.

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